Dessa vez, deixo para vocês, um conto que fiz em 2006 para o concurso Contos do Rio. Eu mudei algumas coisas, mas a ideia é a mesma do anterior.
Espero que gostem e deixem suas impressões a respeito.
Beijo!
O mar que te levou
Ainda me lembro bem daquele dia na praia de Copacabana. O sol brilhava intensamente e o mar estava tão azul que dava gosto de olhar. Morávamos no Rio de Janeiro há apenas alguns meses, por isso, eu e Milena ainda não havíamos perdido o encanto pelo mar. Também pudera, era a primeira vez que tínhamos todo esse contato com ele.
Naquele dia, eu estava particularmente aborrecido com minha mãe. Ela havia me obrigado a acompanhar Milena até a praia para brincar. Não que eu odiasse minha irmãzinha, mas tinham horas que eu queria ficar só e pronto.
Enquanto ela se deliciava na areia, montando castelos e procurando conchinhas. Eu só pensava em como seria bom quando eu não mais tivesse que seguir as ordens dos meus pais.Deitei a cabeça na areia e fiquei imaginando como seria quando eu chegasse aos 18. Em minha opinião, ter 13 anos era demasiado chato, e tudo que eu realmente queria era ser dono do meu próprio nariz. Depois do meu breve estado de revolta, me resignei e comecei a pensar nas viagens que faria. Uma volta ao mundo, quem sabe. E tudo só com uma mochila nas costas, afinal, quem precisava de mais que isso?
Fiquei por ali, perdido em devaneios, sonhando acordado com uma vida onde eu não era obrigado a levar minha irmã mais nova para passear. Fui tirado de meu passeio mental quando por entre os barulhos habituais da praia, consegui distinguir os gritinhos de minha irmã. Levantei atordoado, olhei diretamente para onde eu a havia visto pela última vez e não vi nada além de um castelo semi destruído por uma onda.
Minha primeira reação foi raiva. Que estupidez ela havia feito dessa vez, pensei enraivecido. Se meus pais ao menos sonhassem que eu a havia perdido de vista, era castigo na certa. Aí, adeus férias. Depois, caminhei em direção ao mar. Da distância que eu estava, mal conseguia enxergar, mas não pude deixar de notar aquelas pequenas mãozinhas acenando pra mim.
Senti um nó se formar em minha garganta e corri desesperado para dentro da água. Não deve ser muito fundo, pensei. E entrei no mar, lutando contra as ondas que insistiam em querer me derrubar. Estou chegando, maninha, eu gritava desesperadamente. As mãozinhas ainda se agitavam, mas eu sabia que o tempo estava contra mim.
Consegui chegar até ela. Segurei firme sua mão gelada e tentei arrastá-la junto comigo. Eu lutava contra a correnteza. Parecia inútil continuar lutando. Senti ela escorregar por entre meus dedos finos. Não solta, Milena, consegui gritar. Acho que ela não me ouvia mais. Senti algo forte me puxando e apaguei completamente.
Acordei em um lugar muito diferente do que eu estava acostumado. Tudo era branco demais. Estou no céu, pensei comigo. Pisquei vagarosamente para tentar assimilar as imagens que se formavam diante dos meus olhos. Ainda me sentia meio zonzo. Olhei ao redor e vi um grande jardim com flores de cores inimagináveis. Aquilo parecia um parque. Parecia com a descrição que mamãe nos dava do céu.
De repente, como que em um insight, visualizei tudo que havia acontecido. Lembrei de Milena e comecei a chorar. O que havia acontecido com minha irmã? Ela havia sido salva! Só podia ser isso. Senão, ela estaria junto a mim. Olhei ao redor para ver se consegui enxergá-la. Consegui avistar sua figura minúscula e ela estava sentada em um dos grandes bancos daquilo que eu nomeara “parque do céu”.
Corri ao encontro de minha irmã, pensativo. Afinal, se ela estava ali também, isso significava que nossos pais agora estavam sozinhos. Senti tristeza ao pensar nisso. Olhei para ela e parecia muito melhor do que eu conseguia lembrar. Seus cabelos castanhos brilhavam e seus grandes olhos verdes reluziam sob a luz do sol. Minha irmã parecia muito feliz. Sorri para ela, que retribuiu o sorriso de imediato.
Abri a boca para pronunciar as primeiras palavras, mas ela silenciou minha voz. Levantou o dedinho como quem diz “shhh”. Em seguida, tocou minha mão de leve e eu senti que flutuava. Olhei em volta e já não estava no “parque do céu”. A gente estava de volta ao meu quarto, na casa nova do Rio. Olhei encabulado para a cama e me assustei ao notar que eu estava lá. Mas, como é possível? – pensei. Até onde eu sabia, não era comum estar em dois lugares ao mesmo tempo.
Milena apertou minha mão para que eu olhasse para ela. E pela primeira vez, desde o acidente no mar, ela falou. Minha irmã contou que sua passagem naquele mundo que nos acostumamos a chamar de lar, havia acabado. Ela não iria mais morar com a gente, mas sim, naquele lugar lindo que eu havia visto antes.
Pediu que eu não me entristecesse e nem me culpasse pelo o que havia acontecido. Que eu precisava ser forte. Nossos pais iriam ter ainda mais necessidade de minha presença e alegria. Eu ficava atento a cada palavra que Milena dizia. Aquela voz de anjo. Não queria perder nem por um segundo a doçura de sua presença. Então, ela disse que era chegada à hora de eu voltar definitivamente. Que eu deveria sair daquilo que os médicos intitularam depressão pós-traumática e viver a vida com mais intensidade.
Nunca consegui esquecer suas últimas palavras. “Sempre que sentir saudades, olhe para o mar. Ele me levou, ele me trará”. E para ser sincero, jamais me acostumei com a perda de minha irmã. Sua ausência foi sempre uma presença constante em toda a minha vida. Mas, por mais que pareça loucura, sempre que olho para o mar é como se ela estivesse de fato ao meu lado.
Ainda me lembro bem daquele dia na praia de Copacabana. O sol brilhava intensamente e o mar estava tão azul que dava gosto de olhar. Morávamos no Rio de Janeiro há apenas alguns meses, por isso, eu e Milena ainda não havíamos perdido o encanto pelo mar. Também pudera, era a primeira vez que tínhamos todo esse contato com ele.
Naquele dia, eu estava particularmente aborrecido com minha mãe. Ela havia me obrigado a acompanhar Milena até a praia para brincar. Não que eu odiasse minha irmãzinha, mas tinham horas que eu queria ficar só e pronto.
Enquanto ela se deliciava na areia, montando castelos e procurando conchinhas. Eu só pensava em como seria bom quando eu não mais tivesse que seguir as ordens dos meus pais.Deitei a cabeça na areia e fiquei imaginando como seria quando eu chegasse aos 18. Em minha opinião, ter 13 anos era demasiado chato, e tudo que eu realmente queria era ser dono do meu próprio nariz. Depois do meu breve estado de revolta, me resignei e comecei a pensar nas viagens que faria. Uma volta ao mundo, quem sabe. E tudo só com uma mochila nas costas, afinal, quem precisava de mais que isso?
Fiquei por ali, perdido em devaneios, sonhando acordado com uma vida onde eu não era obrigado a levar minha irmã mais nova para passear. Fui tirado de meu passeio mental quando por entre os barulhos habituais da praia, consegui distinguir os gritinhos de minha irmã. Levantei atordoado, olhei diretamente para onde eu a havia visto pela última vez e não vi nada além de um castelo semi destruído por uma onda.
Minha primeira reação foi raiva. Que estupidez ela havia feito dessa vez, pensei enraivecido. Se meus pais ao menos sonhassem que eu a havia perdido de vista, era castigo na certa. Aí, adeus férias. Depois, caminhei em direção ao mar. Da distância que eu estava, mal conseguia enxergar, mas não pude deixar de notar aquelas pequenas mãozinhas acenando pra mim.
Senti um nó se formar em minha garganta e corri desesperado para dentro da água. Não deve ser muito fundo, pensei. E entrei no mar, lutando contra as ondas que insistiam em querer me derrubar. Estou chegando, maninha, eu gritava desesperadamente. As mãozinhas ainda se agitavam, mas eu sabia que o tempo estava contra mim.
Consegui chegar até ela. Segurei firme sua mão gelada e tentei arrastá-la junto comigo. Eu lutava contra a correnteza. Parecia inútil continuar lutando. Senti ela escorregar por entre meus dedos finos. Não solta, Milena, consegui gritar. Acho que ela não me ouvia mais. Senti algo forte me puxando e apaguei completamente.
Acordei em um lugar muito diferente do que eu estava acostumado. Tudo era branco demais. Estou no céu, pensei comigo. Pisquei vagarosamente para tentar assimilar as imagens que se formavam diante dos meus olhos. Ainda me sentia meio zonzo. Olhei ao redor e vi um grande jardim com flores de cores inimagináveis. Aquilo parecia um parque. Parecia com a descrição que mamãe nos dava do céu.
De repente, como que em um insight, visualizei tudo que havia acontecido. Lembrei de Milena e comecei a chorar. O que havia acontecido com minha irmã? Ela havia sido salva! Só podia ser isso. Senão, ela estaria junto a mim. Olhei ao redor para ver se consegui enxergá-la. Consegui avistar sua figura minúscula e ela estava sentada em um dos grandes bancos daquilo que eu nomeara “parque do céu”.
Corri ao encontro de minha irmã, pensativo. Afinal, se ela estava ali também, isso significava que nossos pais agora estavam sozinhos. Senti tristeza ao pensar nisso. Olhei para ela e parecia muito melhor do que eu conseguia lembrar. Seus cabelos castanhos brilhavam e seus grandes olhos verdes reluziam sob a luz do sol. Minha irmã parecia muito feliz. Sorri para ela, que retribuiu o sorriso de imediato.
Abri a boca para pronunciar as primeiras palavras, mas ela silenciou minha voz. Levantou o dedinho como quem diz “shhh”. Em seguida, tocou minha mão de leve e eu senti que flutuava. Olhei em volta e já não estava no “parque do céu”. A gente estava de volta ao meu quarto, na casa nova do Rio. Olhei encabulado para a cama e me assustei ao notar que eu estava lá. Mas, como é possível? – pensei. Até onde eu sabia, não era comum estar em dois lugares ao mesmo tempo.
Milena apertou minha mão para que eu olhasse para ela. E pela primeira vez, desde o acidente no mar, ela falou. Minha irmã contou que sua passagem naquele mundo que nos acostumamos a chamar de lar, havia acabado. Ela não iria mais morar com a gente, mas sim, naquele lugar lindo que eu havia visto antes.
Pediu que eu não me entristecesse e nem me culpasse pelo o que havia acontecido. Que eu precisava ser forte. Nossos pais iriam ter ainda mais necessidade de minha presença e alegria. Eu ficava atento a cada palavra que Milena dizia. Aquela voz de anjo. Não queria perder nem por um segundo a doçura de sua presença. Então, ela disse que era chegada à hora de eu voltar definitivamente. Que eu deveria sair daquilo que os médicos intitularam depressão pós-traumática e viver a vida com mais intensidade.
Nunca consegui esquecer suas últimas palavras. “Sempre que sentir saudades, olhe para o mar. Ele me levou, ele me trará”. E para ser sincero, jamais me acostumei com a perda de minha irmã. Sua ausência foi sempre uma presença constante em toda a minha vida. Mas, por mais que pareça loucura, sempre que olho para o mar é como se ela estivesse de fato ao meu lado.
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4 comentários:
Pôxa filha lendo este lindo conto que só você sabe descrever,bateu u,a saudade de sua irmazinha Milena e me deu uma vontade de chorar com saudades dela e de você.Bons tempo era quando vcs eram crianças.Pena que o tempo foi curto e não deu para fazermos quase nada nós três juntas.Saudades dos tempos que não voltam mais.
Nossa Gabizinha...fiquei c vontade de chorar...o texto me prendeu...muito bom. Bjs
Tocante. Uma daquelas histórias que não se consegue para de ler. Incrivel como a simplicidade nos eleva a momentos grandiosos, seu conto é assim.
P.S: Achei muito bonito este trecho: Sua ausência foi sempre uma presença constante em toda a minha vida.
Abraços.
Ai, minha mamis comentar sempre me deixa feliz. Obrigada!
Kleiton,
Nunca paro de agardecer sua paciência para vir aqui ler meus textos. Fiquei contente por você ter ficado com vontade de chorar. rs
Thomaz,
Suas palavras que me tocaram! Obrigada pelo apoio e incentivo, viu.
Grande beijo para vocês!
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